Escultura (e) Mecânica

A descoberta da infinitude do mundo da criação de ferramentas mecânicas e o estímulo de um final conhecido para a obra.

Ferramenta para corte em eixo fixo
Questões éticas levantadas no momento da criação artística não acontecem no mundo da engenharia.

Outro dia fui a casa de meus pais e como sempre meu pai quis mostrar em que projeto estava trabalhando no momento. Ele está desenvolvendo um apoio para limitar o corte e fresa em algum eixo. A princípio seria para ajudar a escavar nas madeiras das portas o buraco usado para encaixar as fechaduras. Mas o projeto virou um tipo de limitador que chega próximo a um CNC manual, em que uma tupia corre firmemente dentro de um eixo determinado a uma altura também determinada. Enfim, para chegar a esta ferramenta, meu pai teve que esculpir algumas peças. Eram peças que não existiam e tiveram que ser criadas para que a ferramenta que está montando funcionasse. Eram peças com formas que não existiam no mundo e que tem um propósito dentro de um sistema fechado. Foram concebidas com um sentido determinado e para suas criações técnicas de corte manuais pesados foram usadas. Isso aproxima muito o trabalho que meu pai teve da escultura artística. Por que se difere?

Se difere da arte pela intenção. A ferramenta que meu pai está criando tem uma missão. Embora meu pai não tenha uma grande habilidade de comunicação e não tenha conseguido apresentar ao mundo a real necessidade de desenvolver seu projeto, a criação desta ferramenta aconteceu exatamente para solucionar um problema. Esta falta de habilidade de comunicação de meu pai faz com que essas criações dele pareçam se aproximar mais de esculturas artísticas. Porque como seus espectadores não conseguem alcançar a exatidão da resposta a que estas criações se dão, elas parecem ser criadas pela mesma razão abstrata que estimula a criação artística.

Nesta mesma visita a meus pais tive contato com alguns de seus livros que apresentavam vários dispositivos mecânicos em desenhos técnicos e descrições. Eram versões muito melhores do livrinho que dei de natal a meu pai que trazia 207 (ou sei lá que número era) dispositivos mecânicos. Ele de consulta para fazer seus projetos de ferramentas – e eu achando que o livro que dei o surpreenderia, tsc tsc…

Também foi a partir dessa visita e apresentação do projeto de meu pai que me dei conta da infinitude do mundo da mecânica: para se fazer uma ferramenta é necessário fazer suas peças. Para fazer estas peças, às vezes é necessário fabricar outras ferramentas. E assim recursivamente se vai percebendo um ciclo infinito de necessidades de criação que tem objetivos nítidos.

Essa nitidez do objetivo da criação é muito estimulante e não acontece no mundo da arte. Não existe uma finalidade, uma concretude que justifique claramente a criação da obra artística. Para mim isso traz questões ecológicas, éticas e psicológicas que acabam por desestimular a criação, o uso de materiais, o dispêndio de energia.

Autor: xto

Sou uma pessoa importante para os que me conhecem e consideram.